quarta-feira, junho 3

(Não) Libertar

Por momentos desliga os teus sentidos, peço-te:
liberta-te do chilrear dos pássaros que comungam nas árvores, como se de pessoas se tratassem;
não sintas o soprar do vento que arrasta (também) pensamentos – os bons e os maus;
não temas o correr do rio que vai mas nunca mais vem – como o sentimento por um amor perdido;
não te assustes com o chocar das ondas contra as rochas e que as enruga, como os anos fazem à minha alma;
não te deixes entorpecer pelo pôr-do-sol, onde também se vendem mentiras – a dois;

Liberta-te, solta o teu pensamento e ouve o teu coração.
Sente a breve brisa que conduz o meu beijo ou o aperto no teu coração que transporta o meu abraço.

terça-feira, junho 2

Candeia

Estavas só. Estava só. Sabes, doía-me a alma de tanto tropeçar na multidão. Um cigarro ardia nos meus lábios, mesmo assim frios. Sentia (no ambiente) uma espécie de gelo que lentamente se fundia no frio da escuridão. Passava o meu tempo perdido no meu pensamento. Sabes: quando me perco, não peço ajuda, continuo a andar, sem parar. Nos meus dias de sorte encontro o meu rumo, noutros vagueio como o vento – que não sabe onde começa nem onde termina; mas não desisto, vou caminhando. A companhia dos meus pensamentos acaba por me fazer esquecer que estou sem rumo. Quando desperto – de novo, posso estar num sítio que não queria, que não planeei, mas que subitamente poderá fazer algum (novo) sentido. Foi o que aconteceu: quando me pediste lume. O fogo do isqueiro – por segundos, iluminou o escuro, desprezando a multidão, iluminou (apenas) o teu sorriso perdido na bruma. Agora, o teu cigarro, fazia companhia ao meu combinado numa candeia (única).

Os teus cabelos estavam apenas habituados a serem arrastados e mimados pelo terno vento do Suão: sentia-se. A minha mão, ainda fria, procurava a companhia da tua – sem o saber (ainda). Como se explica a alguém que algo de especial acaba de nascer, quando tudo é instantâneo, pensava eu. Como te explico que estou desarmado, que não tenho forças para te fazer mal? Como te explico que uns segundos depois te conhecer queria dar-te abrigo, precisava do teu abrigo? Se nem eu consigo entender?

Fecha os olhos, abraça-me, peço-te! Deixa-te levar, leva comigo a nossa candeia – sempre acesa- nas trevas e especialmente na luz.