sexta-feira, março 20

Saudades.

Saudade. Sinto falta de ti. Sinto falta do que não sou e queria (tanto) ser. Continuo à janela à espera. Espero que o mundo mude. Espero mudar. Por vezes, tal como hoje, canso-me – desespero. Continuo à janela, as pessoas passam, os sentimentos atravessam-me a cabeça. Ainda não consegues caminhar ao meu lado. Ainda não te disse o quanto te amava hoje. Continuo à janela à espera que a vida passe. Já não uso relógio: a Dona Joaquina leva todos os dias a netinha à escola antes das oito; o Pedro que já é um rapaz crescido passa sempre em passo apressado por volta das oito hora e pico; a Joana e o Rui espalham o seu amor - abraçados e marcam o ponto das dez horas. O meu tempo é um desfilar de personagens, que seguem incansavelmente a sua rotina, dia após dia. Retiro um pouco de cada um, sou egoísta – retiro-lhes o melhor. Guardo para mim o mimo e a ternura da Dona Joaquina, agarro com força a juventude irrequieta mas inocente do Pedro e encho o meu coração com o amor que irradia da Joana e do Rui. Acredito que a nossa vida muda para melhor, se desenvolvermos a capacidade de beber um pouco da felicidade dos que por nós cruzam.
Mas por mais que esforce a minha vista, nunca te vejo a aproximar da minha janela. Procuro-te no horizonte e também no meu coração. Se eu mudar um pouco, posso dar-te mais. Amar é dar tudo o que temos e não temos. Amar é não me importar de perder uma parte da minha alma, do meu corpo – para te entregar a ti que precisas, esperando apenas pelo teu sorriso. Amar é acreditar que vale a pena não desistir. A minha saudade não é nada mais que o desespero da tua ausência. Amar é continuar na janela à espera de te ver: aproximar.

terça-feira, março 17

Prometo que vou tentar escrever.

Sinto falta do cheiro e do toque do papel. Preciso sentir o deslizar da caneta – suavemente – no meio da seda das palavras (ásperas). A solidão desfaz-se em mil nacos. A escrita flui sem sentido e sem rumo. A conversa entre a minha alma e a mão (que escreve) é um diálogo mudo. Um mensageiro fiel e inerte serve de fio condutor. Ousar entoar uma frase “solta” é arriscado. Tentar repetir uma rima é pecado e pensar em recriar a entoação original é dúbio. É um privilégio de poucos – comunicar em silêncio. Consigo-o quando escrevo; quero continuar a falar contigo - meu amor, enquanto os teus olhos passeiam nos meus (e os teus lábios se encolhem). Nenhuma silaba – é necessária: um olhar e um toque (solto) de mimo chegam.
Sentes o que escrevo agora? Sentes o que vou (ainda) escrever? Peço-te, sente o papel a amolecer, suavemente, como num toque de veludo, como num mimo lento que te deixo. A tinta que inicialmente parece criar uma forma difusa: solta-se, espalha-se, matura e deixa a impressão fina e doce de uma letra; a silaba já se perfila; a palavra está ansiosa por nascer e por último a frase espelha o sentido - quando a tinta secar.
Envio-te o meu mensageiro a entoar uma melodia:
“Someone send a runner
For the feeling that I lost today
You must be somewhere in London.”