quarta-feira, junho 24

Viver sem ti

Acordei cedo, mal me sinto. Sabes, ando a tratar mal o meu corpo. Lentamente mexo os dedos e sinto cada parte (frágil) a despertar. Os meus braços ainda estão pesados. As insónias deixaram-me atordoado. O lençol branco tapa apenas parte do meu corpo. Mal consigo abrir os olhos, procuro-te. Temo que estes me mintam; lentamente arrasto a minha mão esperando tocar no teu corpo - preciso de sentir a ausência do teu toque. Levanto-me bruscamente e procuro-te pela casa. Um quarto força a proximidade entre os amantes: empurra a troca de olhares, facilita o toque entre os corpos. Se há momentos em que as almas quase se fundem no meio de um abraço, mimo ou depois de fazerem amor, noutros obriga a falar quando isso é a última coisa que queremos. Nunca quis que isso nos acontecesse: muitas vezes me questionaste porque estava com o olhar estranho, solto: perdido no meu pensamento, era o que eu te respondia. Sem te deixar de amar, por momento algum, soltava-me nos meus pensamentos rebeldes e ao mesmo tempo fazia questão de te deixar solta no teu quarto, no teu mundo.
Levanto-me, procuro aquele roupão cinza, que foi o teu presente naquela noite fria em que te fui buscar ao aeroporto. Nessa noite, não pude deixar de reparar nos teus lábios sensuais e imaginar vezes sem conta, como pronunciariam a palavra: amo-te. Levei-te ao melhor restaurante, levei-te sem rumo numa volta de carro pela cidade. Mal falaste, conseguir ler no teu terno olhar que a minha companhia te agradava. Ainda sentia que não estavas curada do teu coração; sentia que me desejavas mas não querias que eu me aproximasse. Era puro sofrimento para mim, dosear a forma como deveria soltar o meu amor por ti. Subitamente pedes para te leve a casa. Subi as escadas, enquanto contemplava a tua bela silhueta. Ofereceste-me uma bebida, em vez de conversar, acho que desconversámos. Levantei-me, dei-te um beijo e sai apressadamente.
Ainda hoje te procuro nas ruas do Porto, por onde passo. Ainda te procuro nos meus lençóis. Creio que nunca te entendi, não sei se por falta de tempo ou por estupidez minha. Se soubesse o quanto te amava – nesse momento, teria implorado para que ficasses a meu lado, nem que fosse por mais um minuto. Já é tarde, tenho de sair. Bato a porta e corro pelas escadas. Ainda me faltam viver alguns momentos mais – sem ti.

domingo, junho 21

Entardecer

A tarde teima em acabar; o sol esmorece.
A minha barba arranha-te: não te queixas.
Abraço-te.

Uma voz ecoa no espaço.
Anuncia o que não quero ouvir: rejeito-a.
Toco-te.

Algumas nuvens rasgam a beleza do céu.
Metal corroído ecoa parte da luz: sinto-a.
Abraças-me.

O relógio corre sem saber para onde.
Trocamos um beijo: sinto-te.
Mimas-me.

Aperto-te fortemente contra mim.
O sol resiste: aquece(s)-me.
Amo-te.