quinta-feira, maio 9

Solitário Douro

O Douro mantém-se impávido e sereno, servindo de companhia ao meu fim do dia. A hora crepuscular anuncia a chegada apressada da noite e o lusco-fusco criado embeleza a vista, num quadro a aguarela preenchido por um Douro calmo e sereno.

A vista é única e dou por mim a passar o meu olhar pela Igreja de S. Francisco de Assis, parte do edifício da Sé, o mercado da Ribeira e as suas pequenas mas belas casas, que parecem estar agregadas milagrosamente entre as vielas e a proximidade do rio.

A ponte D. Luiz, impávida e bela, parece uma mulher em que a idade não passa. O contemplar da estrutura metálica cruzada, quase, por momentos nos deixa perdidos. Vem duma era, onde a engenharia parecia ser encarada como arte.

No outro extremo - Arrábida,com o seu branco puro, que mesmo no lusco-fusco sobressai e quase encandeia o olhar.

Na maior parte das vezes é esta a passagem que uso e me volta a ligar de novo ao cordão umbilical que me une à minha terra, quando me afasto desta por uns tempos.

Por momentos termino o meu ar de contemplação, imaginando em mil instantes, como seria e o que teria acontecido à Ponte das Barcas. A sua sombra imaginária parece pairar sobre o rio calmo e sereno, ao lado de sombras indefinidas de corpos que esbracejam a lutar contra as águas escuras e profundas do Douro. As “Alminhas da Ponte” bem perto, congregam a memória de cada uma dessas pessoas, que sucumbiram sem entender o porquê.

A noite já está instalada, já sinto o corpo regelado, esqueci-me dele, enquanto mergulhava nos meus pensamentos e me mantinha imóvel. Contemplei um rio que faz parte de mim, que já contemplei para sorrir e também para chorar, recebendo sempre em troca, a sua calma e silêncio ou a força das várias correntes que o impulsionam, arrastando tudo, mesmo memórias boas ou tristes que juntas criam aquilo que eu sou.