sexta-feira, julho 12

Lenta

Fecha-me os olhos, se não conseguires – usa uma venda.
De seguida, levanta a capota, solta os teus cabelos e escolhe um lenço bonito: gosto de ver assim. Arranca um CD riscado que perpetuamente passe aquela música: tu sabes qual é. Por favor: arranca. Arranca sempre, sem olhar para trás. Conduz como num filme em camara lenta.
Leva-me pela costa, preciso de mar. Não pares até chegarmos à baixa, onde param os ricos e os perdidos – como eu.
Já sinto o beijo da maresia, já sinto o abraço do vento. Continua. Entretanto, conversa comigo sem palavras – como eu gosto. Sabes, perdi o discurso e agarrei-me ao pensamento como fazem os afogados às cordas esfarrapadas que lhes atiram. Já perdi dentes, cabelo e pessoas de quem gosto. Não te quero perder a ti. Continua, peço-te. E, para apenas numa qualquer curva apertada – onde nada e ninguém queira parar e deixa-me tirar uma foto ao alcatrão preto, quente e rasgado por linhas brancas cansadas. Quando chegarmos à baixa – beberemos como se não houver amanhã. E quando o momento chegar: agarra-me, ampara-me a vomitar. Leva-me para casa. Dá-me o teu colo para o nascer do dia aconteça com esperança no todo.