quarta-feira, julho 29

Preguiça

Sinto-me fraco. Tenho medo que até o vento me empurre. Fujo da luz que me encandeia. Só no escuro me desligo dos sentidos e me perco no meu pensar. Já passa do meio-dia e o meu lençol ainda me protege. Quando sair, se sair, não olharei para ninguém, temo que me observem. Ah! Fugirei igualmente de todos os espelhos: eles mentem; como me poderão mostrar fielmente a minha silhueta sem me mentir? Como é que alguém mostra como nos vê - sem qualquer juízo de valor? Mas hoje, nem que prometam que só espelham a verdade: não quero saber.

Apetece-me deixar-me arrastar pelo teu abraço: fechar os olhos e sentir que só tu existes no mundo, que tudo o resto foi congelado pelo criador. Que os teus mimos me adormeçam no teu colo e me embalem em mil sonhos doces. Não preciso de mais, prometo.

Mas tenho de me levantar, o corpo dói – de estar dias enterrado num colchão húmido e frio. Os vapores e essências do quarto já não me entorpecem, como dantes o faziam. Tenho que sair e procurar mais. Luto entre o desejo e a preguiça da melancolia. Movo uma perna, como quem, a medo a reaprende a usar. Peço à gravidade que me empurre para fora da cama. Já estou com metade do corpo fora, mas sei que esgotei grande parte da minha força. O que faço para soltar o meu pensamento? Sabes? Esqueci-me que não me respondes, não estás por perto.