quinta-feira, abril 4

O mundo "anormalizado"

A manhã nasce e bem cedo Pedro afasta os lençóis encorrilhados e salta da cama num pulo. Os primeiros passos são feitos com saltos ritmados e apenas apoiados no pé direito. É a sua forma de desejar ter um dia de sorte. O pequeno-almoço e o primeiro mimo do dia estão à sua espera na sala. Salta, abraça e beija a mãe como se fosse a última vez que a vê. Desfruta de cada minuto, da melhor maneira que pode, pois sabe que a mãe tem que sair a correr para ir trabalhar.

A mãe não esconde as rugas duma vida de trabalho, duma vida inteira dedicada ao filho, que com todo amor do mundo o criou. O seu companheiro na altura, tal como um pequeno grão de areia, escorregou-lhe da mão, rapidamente, acabando por ir parar bem longe. Não chegou a conhecer o filho, não o desejava, não o sentia e acima de tudo não a amava.

O Pedro está prestes a estar entregue a si próprio e às suas aventuras, a mãe a correr, beija-o e dá-lhe um abraço bem forte, implorando para que ele não se meta em sarilhos e acima de tudo não se afaste muito da casa.

O dia está a nascer para o Pedro, com a sua mochila onde transporta tudo o que não cabe no seu imaginário, trepa avidamente uma escada íngreme que separa a cave onde vive do mundo real.

Já sente o frio do ar nos seus lábios e enquanto caminha, quase é derrubado por um homem que inicia o dia furioso com a vida que Deus ou ele escolheu seguir.

Por momentos, pareceu ver um reflexo num vidro límpido da Joana. A Joana foi o seu único e verdadeiro amor, quando se conheceram passeavam horas sem fio, ficavam maravilhados a contemplar o céu, a contar as estrelas ou a correrem juntos no parque. Mas tudo não passou duma ilusão, o reflexo tinha-se desvanecido, a Joana não estava lá, aliás a Joana não falava mais com ele, desde aquela noite, em que o Pedro, arrancou do coração toda a coragem do mundo e lhe disse que a amava. A Joana impávida mas assustada não lhe deu resposta, mas no dia seguinte, enquanto o Pedro às escondidas a contemplava, não pode deixar de ouvir as suas risadas, a contar às amigas o que lhe tinha acontecido. O que o assustou mais foi a frieza e a sátira nas palavras da Joana, não entendeu. Fugiu, correu chegando triste e cansado junto da sua mãe, que realmente era a única que o consolava realmente e genuinamente.

Desde esse dia, o Pedro decidiu seguir o seu rumo só. Frequentemente para no caminho para ouvir a conversa das pessoas na rua, a deliciar-se com a melodia dos pássaros ou a passar horas junto ao lago a construir os seus sonhos. Quando cruza com a Sra. Ermelinda, uma velhinha que mora no último andar do seu prédio, onde o elevador teima em não funcionar, lá vai ele a pular ajudar a senhora com as compras. Quando alguém com quem se cruza lhe atira palavras amargas, Pedro, fecha os olhos, encosta a mão ao coração e pensa na sua querida mãe. Tudo passa, tudo perde a importância e tudo volta a ser como dantes.

Já não pensa na Joana, conta os segundos, os minutos, as horas para regressar a casa e correr para o colo da mãe. Fecha os olhos, abraça a mãe e pensa em tudo de bom que lhe aconteceu.

Engole furiosamente uma dúzia de pastilhas, que o Sr. Doutor entregou a mãe, enquanto sussurrava que assim ele conseguiria estar calmo e parecer normal. Ele nunca entendeu bem o significado do ser “normal”, pois vive feliz e já percebeu que o amor da sua mãe e a natureza que i rodeia - o faz sentir único.

segunda-feira, abril 1

À bolina

Ainda me lembro do teu primeiro olhar, do teu cheiro, do teu terno toque, do teu abraçar e p’ra sempre do teu beijar. Deste-me a mão e amparaste-me como nunca nenhuma mulher o tinha feito.

Foste como uma peça perfeita e bela, que me embalou os sonhos e me ajudou a não temer os pesadelos.

Já tive mulheres que me acompanhavam, enquanto eu continuava só, nem a sua sombra num dia de sol, era suficiente para me trazer algum conforto. Nenhuma, como tu, foi capaz de mover o Sol para me poupar.

Perdoa-me, senão te mereci, se te magoei ou feri.

A tempestade do meu ser, empurra-me à bolina, num mar revolto sem fim.

No fim, a minha estória é fácil de escrever, termino à procura duma palavra qualquer para justificar e rimar com solidão.