segunda-feira, setembro 5

Fumo na curva

I
Deitados e imóveis: deixo roçar a minha barba na tua cara, espero que não fiques com repulsa. Há um fumo no quarto que se esvai. Foi o fumo que nos uniu. Entorpeceu os teus olhos e fez-te ver mais de mim do que eu vejo quando me cruzo com um reflexo. Fumo que se solta de cigarros agarrado a momentos (mais que) vividos. Fumo que mata, que cheira mal, que irrita, que enoja e que embacia o cristal.

II
O horizonte espelha o mar azul que ilude, espero que não te canses. Encosta-te a meu lado e sente a maresia. Nuvens que passam num colorido infinitamente belo beijam o nosso olhar - num laranja gradiente. Uma pedra de gelo brinca com a luz.: um prisma perfeito fascina-me. Levanto-me a agarro-me. Deixo-me levar pelo vento salgado que me abana. Passeio nos teus lábios, já sentia falta deles.

III
Tombas o teu corpo sobre o meu, largo o travão de mão e acelero: não temas. Viro, acelero e faço uma curva apertada. Como eu a conheço. Como ela conhece os meus pensamentos. Acelero para a passar bem rápido. Ela trava-me e segura-me para que eu não caia (na berma). Suga-me os meus pensamentos como uma amante (perigosa). Deixo-me ir. Já pensei nela fechar os olhos. Não o fiz, contigo ao meu lado – não o farei.