terça-feira, junho 9

Trilhos

Mal me lembra como te reencontrei. Foi num daqueles meses em que a Primavera já ia longa. Vivemos tudo muito intensamente, até ao dia em que me despedi de ti – no teu sofá. Apenas te pedi: não me voltes a ligar! Não sabia se seria suficientemente forte para não te atender. Não sabia se ia resistir e pedir para te ver mais uma vez. Bati a porta, com o coração confuso e com o pensamento disperso. Sai a correr, umas voltas de carro e parei num bar qualquer. Pensei em tudo o que nos tinha acontecido. Vivi em repetição cada momento. De nada te culpei. Se calhar tinha sido eu, que te tinha asfixiado. Ainda hoje não me entendo: como é que me tinha entregue a uma mulher tão rapidamente? Não me tinhas prendido pelo sexo. Mal nos conhecíamos: nem sabia como gostavas que te beijasse. O teu olhar – sim – prendia-me. O nosso carinho ainda era trocado a medo, como se de dois desconhecidos se tratasse que se tinham conhecido no meio de uns tantos estranhos. Foi, num daqueles sítios onde a penumbra apaga qualquer rasgo de luz. Aqueles lugares onde os perdidos vão e acabam ainda mais perdidos. Onde nem o álcool adormece o suficiente para vaporizar a dor de alma. Nunca mais a vou ver – pensei eu. O destino geralmente nunca nos dá duas hipóteses: enerva-me quem pensa o contrário.
Mas lá estás tu, um belo dia – perto de uns trilhos, que nos serviram para nos aproximar e que também nos servem de mote (hoje) para breves despedidas. Se me perderes de vista, peço-te procura-me junto aos trilhos, é lá que me despeço de ti, é lá que fico imóvel à espera de te ver partir ou chegar e foi lá que te reencontrei. Procura-me lá, sempre.