quinta-feira, dezembro 11

Eléctrico Perdido

O eléctrico desce, imparável, em direcção aos Aliados. Sentado junto a uma janela entreaberta, sinto a essência matinal da cidade. Raramente estou acordado a esta hora (por isso ainda mais prezo o momento). As pessoas na rua, em silêncio, descem a rua. Ao meu lado uma velha senhora faz questão de me oferecer o seu sorriso, sempre que os nossos olhares se cruzam. A beleza no interior do eléctrico ata-me, faz-me esquecer o desconforto do lugar. Delicio-me, ainda, com o ruído único do toque de metal durante a travagem – é como uma melodia (para os meus ouvidos). Uma campainha aflita toca para afugentar os distraídos, os perdidos (de pensamento ou da alma).
Penso em ti. Já passou (quase) um mês desde a nossa última conversa. Estávamos apaixonados e felizes. Descobri que te amava, rapidamente. Penso em silêncio: será que o amor fraco e o amor muito forte, por razões diferentes, estão condenados a morrer? Estará tudo condenado a desaparecer, tal como a própria vida? Nos dias pares sinto que sim, nos impares (os meus favoritos) sonho com a eternidade (dos sentimentos e da vida). Aprendi, que precisava de amor e paixão da mesma forma que do ar, dos meus livros, de escrever ou de fotografar. Sei que escrevo para imortalizar ou sonhar, tiro uma fotografia para eternizar um momento bom, leio um livro à procura de alimento e respiro por necessidade humana.
Sentia-me completo e feliz. Lembra-me, como os outros homens me invejavam de te ter a meu lado. Isso não importava; sabia que o teu abraço era meu. Era tão forte a nossa paixão, que não havia espaço no nosso coração ou desejo do nosso corpo para mais alguém.
Nunca moramos juntos, tínhamos medo de que complicasse tudo; tinhas o teu espaço, eu o meu. Escolhemos uma vida de verdadeiros amantes; um qualquer instante rapidamente se transformava num momento de paixão. O toque do meu telemóvel quase sempre anunciava uma nova mensagem tua ou o ecoar da tua rouca (e bela) voz. Revivo a imagem do teu corpo nu; das nossas conversas serenas depois dos momentos mais tórridos de paixão. Conhecia cada milímetro do teu corpo - onde te tocar para te dar prazer.
Escrevo na primeira pessoa, mas sei que o que sentimos era tão forte que só poderia ser reciproco. Não me atrevo a escrever por ti, pois não conseguiria reproduzir a tua harmonia na escrita.
Os nossos destinos cruzaram-se por acaso e afastaram-nos passado uns anos. Não te despediste de mim – não o queria, não o queríamos. Nem sequer me aproximei do aeroporto no dia da tua partida. Não conseguiria. Iria implorar-te para ficar, para deixar o resto para trás. Não o fiz, não sei se me devo arrepender. Onde quer que estejas, queria dizer-te que ainda te amo, muito …