sábado, janeiro 31

Escrevo, escreves?

Para e sente o som da minha escrita:
ouve o eco das palavras que solto e procura o seu trago no papel sofrido.
Porque escrevo?
Quero que me entendas, peço-te!
Escreve quem tem pouca esperança de viver o que lhe falta (ainda):
a alma, uma caneta e um papel num instante - chegam.
Escreve quem precisa de verter as lágrimas da alma:
sem pudor de o fazer.
Escreve quem não anseia ser lido, ser interpretado ou elogiado por sujar um papel:
com os seus escritos de sabor a fel.
Escreve quem vive no universo da sua imaginação:
porque a vida vivida sabe a pouco.
Escreve quem ama, quem perde – quem vive na agonia do pensamento.

quinta-feira, janeiro 29

Conto Infantil

Há uma folha que (finalmente) cai. Ficou esquecida numa árvore abrigada da intempérie. É uma resistente e só largou o seu ramo quando ficou cansada: desistiu. Assistiu a mil tormentas, foi perdendo uma a uma a companhia – das outras folhas: sentiu saudade. Teve uma eternidade para pensar, especialmente quando ficou sozinha no ramo. Lentamente, foi largando tudo e deixou-se cair. Num bailado único foi deslizando: ora num sentido, ora no outro. Acabando por suavemente esbarrar com o chão (o suposto fim). Mas ao contrário do que pensava, nada acabou: ainda sente dor, ainda pensa e não matou a consciência do seu ser. Agora no chão, solta e só, é arrastada pelo vento e contra a sua vontade – continua a viagem.